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Humildade e Realismo


Em Belém do Pará, respiramos Círio de Nazaré. Estamos para encerrar a "Quadra Nazarena", quinze dias de verdadeira missão, recebendo Bispos do Brasil inteiro que acolhem nosso convite a pregar a Palavra de Deus, anunciando vigorosamente a Boa Nova que converte os nossos corações. Fazemos tudo isso envolvidos pelo manto amoroso de Nossa Senhora de Nazaré, Mãe e Rainha da Amazônia, que neste Círio invocamos com as palavras "Salve, Rainha, Mãe de Misericórdia". Tem sido uma oportunidade de divulgar e rezar mais uma das mais belas e profundas orações marianas da Igreja. Visitamos famílias, percorremos os mais diversos ambientes e levamos a Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Nazaré aos mais desafiadores recantos humanos. Enfim, nos dois dias centrais do Círio de Nazaré do corrente ano, as multidões acorreram a Belém e nos deixaram preciosas lições, que acompanharão nossa experiência da fé. Uma delas diz respeito à oração.


É impossível imaginar o número de mãos que se elevaram espalmadas para o Ícone principal da presença de Nossa Senhora entre nós, que é sua imagem, a percorrer as ruas de Belém, envolvendo-nos em cordas de amor. Fixo primeiro o meu olhar para as crianças, muitas delas percorrendo etapas de verdadeira iniciação cristã, ao colo de seus pais e mães, com os olhos brilhantes, tantas vestidas de anjos, e as mãos se voltavam para a Imagem Peregrina. Pequenas as mãos, pequena a Imagem, imensa, do tamanho da eternidade a experiência de proximidade e comunhão. Um menino, acomodado sobre os ombros do próprio pai, perguntado se assim estaria no próximo ano, respondeu com candura que, da próxima vez, já seria "maior e grande"! Será uma outra etapa, mais intensa ainda, porque os passos serão cada vez mais os seus próprios passos. Daqui a pouco, este e outros desejarão estar perto da Berlinda da Virgem de Nazaré, conduzindo-a por nossas ruas. Belém tem uma reserva especial de devoção e de formação, única em sua configuração, desafiadora para o cuidado a ser oferecido pela própria Igreja!


Nas mãos das crianças, a oração! Oração que é feita de gestos e de olhares, poucas palavras, coração inteiro, pura emoção. Sim, oração é comunhão com Deus, comunicação gratuita que vem dele e alcança todos os seus filhos e filhas. Pais e mães descubram o jeito de evangelizar, que começa na geração dos frutos de suas entranhas, passa pelo colo, alcança as mãos que se unem para o sinal da Cruz aprendido na infância, pede encaminhamento à Catequese de iniciação Cristã, para se completar e consolidar na participação da Comunidade cristã, especialmente na Eucaristia dominical em família. São sonhos que se mostram possíveis, pois passam pelas nossas ruas e limpam os olhos!


E as outras mãos? Tenho o privilégio de acolher a multidão que chega às proximidades da Basílica de Nazaré, no dia do Círio. Aprendi a valorizar os encontros com tantas pessoas, cujos nomes não sei, mas cujos olhares e mãos estendidas em oração consigo identificar e passam diante de meus olhos, para rezar por estas pessoas que foram confiadas ao meu pastoreio. Nestas mãos vejo impurezas que são lavadas, muitas até feridas pelas maldades praticadas. Nelas identifico os sonhos e esperanças. Não alimento ilusões, pois meu povo é parecido com tantos outros rebanhos. Ele também está eivado de problemas, violência, corrupção, desonestidade, insensibilidade, infidelidades e adultério, pecado. Mas as mãos que se elevam, quando o Círio faz todos iguais, são preces que sobem ao Céu, angústias superadas, esperança que se acende. Os pedaços de corda levados para casa se transformem em apelo à lembrança de que não estamos jogados ao léu neste mundo, mas somos filhos e filhas, gente amada por Deus, e que ele mesmo nos deu por Mãe a Virgem de Nazaré, cujo encanto dobra a dureza de nossos corações, tantas vezes empedernidos!

Justamente neste final de semana, quando se encerram as celebrações festivas em honra de Nossa Senhora de Nazaré, a Igreja nos faz ir ao Templo (Cf. Lc 18, 9-14), conduzidos pelas mãos de Jesus, que nos conta a Parábola do Fariseu e do Publicano. "Para alguns que confiavam na sua própria justiça e desprezavam os outros, Jesus contou esta parábola..." diz o Evangelista São Lucas (Lc 18, 9). O fariseu reza em pé agradece a Deus por não ser como os outros: ladrões, desonestos, adúlteros. Sua oração é um elogio de si mesmo, exaltação de suas qualidades, desprezo pelo outro que não sabe rezar. Ele não se sente irmão. O publicano nem ousa levantar o olhar: "Meu Deus, tem compaixão de mim, que sou pecador!" (Lc 18. 13). Realismo e humildade. E este voltou para casa justificado.


A humildade muitas vezes é a virtude menos conhecida e menos apreciada. Seu oposto, o orgulho, parece ser o soberano deste mundo. Contra ele está, porém, a palavra do Senhor, cortante como uma espada: "Todo aquele que se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado" (Lc 14, 11). Deus não quer que ninguém seja humilhado, mas o gesto de humilhar-se, fazer-se pequeno, é expressão máxima do amor. A humildade é verdade e não hipocrisia. Não se trata se negar o bem que há em nós, mas referir este bem ao seu verdadeiro autor. Que se coloca diante de Deus, toma consciência de seus limites, como foi a experiência de Pedro (Lc 5, 8): "Simão Pedro caiu de joelhos diante de Jesus, dizendo: Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um pecador!" E nasce a atitude de confiança total em Deus, que abre o coração para a graça. Aí Deus mobiliza seu poder para o humilde e não para o orgulhoso, porque este atribuiria a si mesmo as maravilhas que Deus realiza.


Quem realizou de modo completo esta atitude de realismo e humildade foi Maria, que se sentiu "pobre serva", um vazio à espera de ser preenchido por Deus. E ele elevou o seu nada e o tornou tão grande que todas as gerações a chamarão bem-aventurada (Cf. Lc 1, 46-55). Nela se realiza a atitude fundamental dos "pobres de Javé", que não têm nada e sabem disso: "Confia no Senhor e faze o bem, e sobre a terra habitarás em segurança. Coloca no Senhor tua alegria, e ele dará o que pedir teu coração. Deixa aos cuidados do Senhor o teu destino, confia nele, e com certeza ele agirá. Fará brilhar tua inocência como a luz, e o teu direito, como o sol do meio-dia. Repousa no Senhor e espera nele" (Sl 36, 7).


Enfim, humildade e realismo se encontram em Cristo: "Ele, existindo em forma divina, não se apegou ao ser igual a Deus, mas despojou-se, assumindo a forma de escravo e tornando-se semelhante ao ser humano. E encontrado em aspecto humano, humilhou-se, fazendo-se obediente até a morte – e morte de cruz. Por isso, Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o Nome que está acima de todo nome, para que, ao nome de Jesus, todo joelho se dobre no céu, na terra e abaixo da terra, e toda língua confesse: 'Jesus Cristo é o Senhor', para a glória de Deus Pai!"(Fp 2, 6-11)!


Dom Alberto Taveira Corrêa Arcebispo de Belém do Pará

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